quinta-feira, 20 de março de 2014

Diário - Dia 04/04/2013 - Furos

Não sei quando ou por quanto tempo dormi, mas a estilingada da minha mandíbula quebrada e o Sol na fuça me fizeram acordar. Estava sentado no sofá de napa que parecia pipocar a cada sacolejada da minha bunda. Eita barulhada da porra. Aquela droga colocada num quarto onde, teoricamente, só tinha convalescente era perfeito. O doente ficava doido com a zueira que o visitante fazia no sofá do capeta, lascava um trem pesado na cabeça do infeliz (normalmente familiar) e agora eram dois internados, todo mundo contente enfiando dinheiro na conta (pra não dizer outro lugar) do hospital.

Minha cabeça pendia pra esquerda e o fio de baba que desceu quase solidificou. Apenas arregalei os olhos pra ver as horas no relógio e vi que não tinha hibernado nem por 2. Tentei colocar a cabeça reta mas o pescoço gritou e me mandou ficar naquela posição mesmo. Não protestei com ele e fiquei na minha… torto.

Fechei a boca e senti aquela baba fria que descia agora da bochecha esquerda até o ombro, tentei sugar a gosma de volta, mas não rendeu. Meti a mãozona mesmo e a meleca ficou colada como se fosse gel. Que droga eu tinha tomado na noite passada? Tinha tempo que enão me pirulitava pra perto dessas merdas…

Como todo mundo sabe, a toalha do homem é a sua bermuda. Então foi lá mesmo que eu limpei a mão. Tive que esfregar pra burro até a coisa toda sair, mas saiu. O inferno é que no meio do processo entrou uma enfermeira no quarto. Da uma bisoiada na cena:

Você entra num quarto e vê uma criatura toda torta, de boca aberta, gemendo e esfregando as duas mãos na bermuda (inclusive na parte da frente) alucinadamente, o que você pensa?

a) o nobre senhor está com torcicolo e com a mão repleta de saliva, e está tentando limpar na bermuda;

b) um infeliz com retardo mental escapou do hospício, entrou no quarto e está se coçando todo;

c) um depravado invadiu o quarto e está batendo uma pra mulher que está dormindo na cama ao lado.

Advinha qual a infeliz escolheu?

“Guardas!! Guardas!! Tem outro punheteiro aqui. Corre!”

“Não doida! Que punheteiro? Eu tô coçando a mão.” Tentei eu convencer a enfermeira, caminhando com o pescoço torto e esticando os braços pra cima dela. Merda.

“Segurança, ele tá querendo me estrupar!” Puta merda, como se eu fosse “estrupar” aquilo. A louca, metida na sua roupa ofuscantemente branca, devia pesar uns 120kg de pura feiura e mal-encaramento. Só faltava a “berruga” pra virar uma bruxa. Quando ela virou pra chamar a segurança de novo, vi na sua nuca, meio escondido pelo rabo-de-cavalo, uma chapoca de uma “berruga” preta e nojenta… pronto! Não faltava mais nada, era bruxa mesmo.

"Calma dona! Você entendeu err..." A mão gigante do segurança envolveu meu pescoço empenado e numa xuxada só deu uma indireitada joinha no bicho. Lógico que eu gritei no meio da lanternagem forçada.

"Por favor senhor, gostaria, por obséquio, de pedir a humilde gentileza de Vossa Senhoria de parar de se masturbar no interior dos quartos dos pacientes. Esta é uma conduta rude e inadmissível neste estabelecimento de saúde." Educado o desgraçado... educado e forte.

"Grasp! Rorc, quis porrrrrrr!" Tentei dizer com educação.

"Perdão senhor! Não consegui entender direito." Outro apertão. Não dava pra ver, mas pelo tamanho da mão do maldito, tenho certeza que os dedos se tocaram no meio da minha nuca. Analisando friamente, o segurança deveria ter uns 2,56m e pesar uns 325kg. Era um alemãozão, mas o alvejante que o deixou tão branco assim tinha que ser nacional. A pele não tinha uma manchinha sequer.

"Rrrrrrorrrc!" Dei dois tapinhas de leve na mão do sujeito, para tentar falar um pouco, explicar a situação e evitar uma morte dolorosa.

"Ah, perdão senhor! Apertei muito o seu pescoço? Não foi minha intenção!" Soltou meu pescoço e eu percebi que a C3 e C4 não estavam no local adequado. Mas o pescoço parou de doer. Olhei meus pés e mãos e percebi que mantinha os movimentos. Saí no lucro.

Depois de tossir um pouco e quase cuspir o pulmão, emendei: "Eu não fiz nada. Sou marido da paciente e só estava tentando limpar a mão."

"Isso é verdade senhora?" Interrogou o marmanjo.

"É sim. Ele é meu marido." Mandou a Rafa de bate-pronto.

"Hã? Rafa, você tá acordada?"

"O que você acha?"

"Hã... daqui parece que sim, mas tem quanto tempo?"

"Uns 15 minutos."

"Porra! E porque você não explicou tudo de início?"

"Sei lá... deu vontade de ver o que você ia fazer."

"O quê? A única coisa que eu podia fazer era morrer. E isso não ia demorar muito."

"Senhora, a senhora confirma que o meliante é seu marido e que não estava se masturbando?"

"Confirmo o meu marido, mas não garanto que ele não estava se masturbando."

"Eita! O que eu fiz para você?"

"Então senhor, peço perdão pelo pescoço."

"Tudo bem cara. Relaxa." Pra falar a verdade o esmagamento até tinha sido bom (tirando o fato que quase me matou), pelo menos o negócio tava direito agora.

"Perdão... fica aqui no quarto. Ele pode ser marido, mas não confio no sujeito. Ele pode querer me atacar ou bater uma na minha frente." A bruxa ordenou para o recém nomeado segurança.

"Não se preocupe, minha senhora. Não tenho a menor intenção de me masturbar na sua frente."

"Não seria o primeiro."

Segurei o vômito ao pensar na cena, mas mantive a pose.

"Que seja. O que a senhora veio fazer aqui?"

"Vim dar banho na neném."

"Ai que bom. Estou doida pra aprender." A Rafa saltou da cama. Quando ela bateu com os pés no chão mirei direto pro chão esperando as tripas dela espalharem pelo quarto. Tomei um susto quando nada caiu. É... até que o médico costurou a priquita direitinho. Bom pra mim.

"E aonde está a banheira com água aquecida?" Perguntei à bruxa.

A desgraçada rodou a cara pra mim, apertou um pouco os olhos, relaxou, voltou para a Rafa e respondeu: "Mãe, não se preocupe, a água do hospital é levemente aquecida e eu darei banho na pia do banheiro mesmo. É bem simples." Pronto. Agora de "estrupador" virei um nada... oh rotina que é uma bosta!

A pseudo-enfermeira-gostosona foi até o bercinho da Camila. Com uma mão a segurou e com a outra descascou da bichinha o montueiro de panos numa velocidade esquisita.

"Epa! Calma lá! Ela é só uma neném. Tem que ter cuidado com o corpinho dela."

A fiu-fiu-do-inferno olhou pra mim de novo, apertou os olhos, virou pra Rafa e desembuchou: "Não se preocupe mãe. Os recém-nascidos são mais fortes que nós pensamos. Pode parecer que estou sendo rápida, mas tenho muita prática e jamais faria nada com seu tesourozinho." A Rafa riu como se enfermeira fosse sua mãe. Que porra era aquela?

Ela terminou de desembrulhar a Camilinha como se estivesse morta de fome e minha neném fosse um serenata super-ultra-blaster-master-gigante. Levou o pedacinho de carne enrugada pra pia (Ei! Não é porque é minha filha que tenho que largar a sinceridade na Conchinchina. Ela tava enrugada mesmo. Mas era a minha tchutchuquinha enrugada, que fique claro). O bizarro da jogada é que a miseravelzinha não deu um piu. Não chorou, não berrou, não soluçou, nem deu uma cagadinha na mão da pestilenta. Tomou o banho como quem toma chá das 5. Malditos ingleses esnobes!

Terminada a sessão de relaxamento nas águas termais, a monja foi novamente enrolada em uma toalha pela gostosinha-da-enfermaria. Parecia mais uma boneca de cera, a sem-vergonha.

"Dá ela pra mim. Quero segurar um pouco." A voyer me mirou de novo, apertou os olhos pestilentos, virou pra Rafa, esta devolveu um acenozinho de cabeça (maldita cúmplice) e a neném foi passada pros meus braços.

Deve ter demorado uns 3 décimos de segundo para infeliz começar a chorar. "Devo ter esquecido de tirar os espinhos da mão." Pensei.

Camila me foi tomada de novo pela enfermeira e todo mundo me olhou como se eu tivesse batido na menina. O segurança mãozudo balançava a cabeça devagarzinho de um lado pro outro. Que vontade de enfiar a mão na cara dele. Mas, como se eu tivesse tentado isso, provavelmente, ele teria arrancado a minha mão, comido e palitado os dentes com os ossos, preferi prestar atenção na minha filha. Sou um pai responsável, sabe?

"Pega o brinco Thiago."

"Hã?" Despertei do meu sono assassino com o segurança.

"O brinco."

"Ah tá." Zapiei no bolso da bermuda e achei a sacolinha com os dois brinquinhos de ouro da Camila. "Tão aqui." Cacete! Duas bolebinhas minúsculas e larguei 100 contos na loja. Bicho, esse negócio de ter filha mulher não ia prestar. O Felipe tá com 02 anos e meio e até agora eu só comprei pra ele uma guitarra, uma bola, um palhaço e um quebra-cabeça, tudo no 1,99. Juntando a bagaça toda, num deu nem 10 reaus e com essa menina eu já desemboquei mais do que gastaria com o Felipe em 07 anos. Merda!

Os brincos pularam para a mão gordurosa da enfermeira. Camila foi para a cama e ela se preparou para colocar os bichinhos no lugar devido. Assim eu esperava, pelo menos.

"Ah, vai colocar aqui mesmo? Que bom. E cadê a maquininha pra colocar os brincos? Vai ter uma anestesiazinha?" Eu parecia um moleque catarrento de 05 meses falando.

Vocês já sabem o que aconteceu, né? A enfermeira olhou pra mim e apertou os olhos, mas agora molhou os lábios com a língua. Que porra cara! Acho que vou sonhar com essa doente minha vida inteira. Acho que ela tava tentando me seduzir (sem sucesso, vou deixar claro!). Virou pra Rafa, apertou o botãozinho de trocar de personalidade e falou: "Mãe, pode ficar tranquila. Vou colocar o brinquinho com a mão mesmo. Não vai doer nada. A carne dela é muito molinha e ela nem vai chorar. Eu garanto. Nem sangue vai sair." A Rafa suspirou aliviada.

Credo! O que era aquilo? A masoquista podia falar pra Rafa que iria extrair a rótula dela com uma colher que minha patroa continuava com aquele sorriso abobado. Só eu estava lúcido na sala?

A enfermeira pegou o brinco e direcionou pra orelhinha linda da minha fihota.

"Mas nem que a vaca tussa, sua doida!" Tentei ir pra cima da enfermeira impedir essa mutilação nazista.

A enviada-do-saci nem precisou falar nada. Olhou para o segurança e a mão dele (que tem vida própria), voou pro meu pescoço.

Fiquei engasgando até a maldita terminar de colocar os brincos. O pior é que a Camila nem chorou, nem sangue saiu. Saco.

Depois que o segurança pediu três vezes com educação pra a própria mão largar o meu pescoço, ela obedeceu meio emburrada e eu fui para o chão. Fiquei tossindo e tentando cuspir a minha pleura, sem muito sucesso, até a gostosa-da-UTI sair do quarto.

"Credo Thiago! Que ignorância! Precisava tratar a moça daquele jeito?" A Rafa devia ter sido hipnotizada. Só pode.

Em vez de responder, preferi ficar tossinho. Tava até legal. Não tinha nada melhor pra fazer mesmo.

Enquanto isso, a porta abriu de novo, outra enfermeira entrou. Estava segurando uma bandeja de inox e uma folha branca cheia de quadradinhos.

"Mas que neném linda! Mamãe, vamos fazer o teste do pezinho nessa gostosura?" E sacou um agulha de uns 35cm de comprimento.

"Mas nem fudendo sua va.... gasp. curp. Rrooorrorc" A mão do segurança, que estava de bobis pelo quarto, voou de volta pro meu pescoço, mas agora não seria boazinha. Tava querendo sangue, a maldita.

"Olá senhor! Noto pelo seu olhar que o senhor está deverás irritado. Porém tenho certeza absoluta que isso não é outra coisa senão toda a preocupação de um pai dedicado que passou a noite em claro cuidado de sua filha. Seu amor por ela me emociona. O melhor remédio para essas situações é o sono. Creio que algumas horas de um gostoso sono profundo deixará sua mente muito mais relaxada e o seu coração mais leve. Deixe-me proporcionar para o senhor esse momento de tranquilidade." E xuxou de novo os dedos no meu pescoço. Eta mão grande! Parecia que os dedos iam dar a volta no pescoço e se encontrar de novo no gogó. Eu comecei a engasgar outra vez. Foi ficando de noite. Meus braços relaxaram e eu dormi.

Quando acordei, já estava em casa. Mais precisamente no chão, no meio da sala de estar. A Rafa me disse que eu fui trazido no porta-malas do nosso carro. O segurança veio dirigindo. Quando perguntei porque não me jogaram no banco de trás do carro ela arregalou os olhos como se tivesse tido uma porra de uma epifania. "Caramba! Nem pensei nisso! Nossa amor, desculpa. Estava tão preocupada com a neném".

Quando cheguei no banheiro (me arrastando) olhei para o espelho e vi as marcas roxas que a mão do segurança tinham largado. Mirei de perto... cacete! O caminho das veias dos dedos dele ficou marcado. Ainda bem que ele não tinha tatuagem ali, senão eu tava carimbado também.

Uma mandíbula quebrada e o pescoço fudido. Vou ter sorte se ficar vivo até o fim da semana.

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