Sábado de manhã. Estava estirado no sofá só de bermuda para descansar de uma noite mal dormida. Minha esposa me chama na cozinha e eu a convenço de que conversar na sala era melhor.
— Nosso filho está com medo de papai noel.
— Ah! Até parece! Ninguém tem medo de papai noel.
— Ele tem.
— Se fosse de palhaço ainda...
— Não. É papai noel mesmo.
— Nossa! Como isso começou?
— Ele viu um numa loja e se assustou.
— Quando?
— Ontem com a empregada.
— Medo de um dia não é medo, é respeito autoprotetivo.
— De onde você tirou isso?
— ESPN.
— Canal de esporte ensina como criar filho.
— Esporte ensina muita coisa.
— Não isso.
— Tanto faz.
— Vai logo.
— Vai logo o quê?
— Tirar o medo dele.
— E como eu faço isso? Com uma colher?
— Não abusa.
— Sério. Como eu resolvo um negócio desses?
— Você é homem, já deve ter passado por isso.
— Já disse que eu não tenho medo de papai noel. Se fosse de palhaço...
— Para de enrolar, eu já joguei fora a camisa de palhacinho dele.
— Nossa! Aquilo me dava medo. Lembra quando eu me mij...
— Logo! Droga.
— Tá bom! Tá bom! Eu resolvo. Afinal, para todos chega o dia em que o menino passa a ser homem.
— Ele tem 02 anos. Cristo!
— Então o dia dele chegou cedo.
— Deus! Por que eu não ouvi mamãe e foi servir o exército na Guatemala?
— Vixe! Não exagera. Vou com ele nessa loja agora.
Peguei meu menino e foi caminhando com ele, firme, para enfrentar seus medos. Na verdade eu o arrastei por 02 quilômetros enquanto ele chorava, mas, no final, da no mesmo.
Nessas horas o importante para um pai é manter a postura de macho alfa. Olhar severo, peito estufado e um completo fingimento sobre as milhares de dúvidas que pipocam na sua cabeça a cada 15 segundos. O que conta é o filho olhar para você e enxergar um ideário para o futuro dele. Coitado. Como é fácil tapear criança.
— Não papai noel. — Disse ele todo choroso.
— Quietinho. Papai vai mostrar que não precisa ter medo de papai noel.
— Não papai noel.
— Já disse para relaxar. Vai dar tudo certo. Papai vai te proteger do...
— Não papai noel.
— Olha! A gente já está chegando. Eu vou mos...
— Não papai noel.
Olhando para meu filho tentei (em vão) transmitir confiança. Não tinha jeito de persuadir o moleque. Encostei na porta da loja e, enquanto meu filho gritava desesperado, pude ver de rabo-de-olho o pé o maldito velhinho.
— Tá vendo meu filho. Não precisa ter medo do... Ah demônio!
A figura medonha da desgraça natalina estava enfeitando a porcaria da loja que, por sinal, devia ser um portal para o inferno (figura abaixo). Agarrei meu neném pelas pernas e sai correndo com ele pela rua afora gritando desesperado. Ainda era o macho alfa, mas um macho alfa que gritava como uma louca.
Este texto é meu, mas quem está escrevendo é minha esposa...
— Oi gente.
— Amor. Não faz isso, o texto é meu, poxa.
— Cala a boca. O negócio é o seguinte. Depois que ele chegou, chorando como um neném, nosso filho foi acudi-lo um pouco enquanto eu terminava o almoço.
— Não conta iss...
— Da pra ficar quieto? Cristo!
— Agora ele está debaixo da cama com nosso filho. Ele disse que foi brincar de cabana com ele. Vocês acreditam né?
— Pelo visto, chega o dia em que todo o menino tem que enfrentar seus medos e virar homem. Acho que o dia do meu marido ainda não chegou. Quem é o macho alfa aqui mesmo?
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